24 maio 2008

A noite da GNR

Certa vez, eu e o Marralheiro resolvemos ir beber uns copos ao Pinto, para ver quem é que aguentava mais. Lá fomos e passámos a tarde toda a beber e, como na altura estávamos “em forma”, nenhum de nós caiu para o lado. Quando o Pinto fechou, decidimos que devíamos continuar, pois ainda estávamos bem e havia que arranjar um vencedor. Decidimos, então, ir até um bar na rua das matemáticas beber mais umas canecas de cerveja. Só que eram tempos difíceis, o dinheiro era pouco (como hoje!), e aquilo era um bocado mais caro que o Pinto, mas pronto, um dia não são dias e lá mandámos vir duas canecas. “Mandámos” é como quem diz: vimo-nos à rasca para que o incompetente e malcriado empregado nos viesse atender, e aquilo era um barzito pequeno que não justificava tanta demora; o malcriado, após estarmos ali que tempos, ainda veio com maus modos, como se nos estivesse a fazer um favor, como se não tivesse obrigação de nos dizer os preços da cerveja de garrafa, do fino, da caneca, das outras possíveis bebidas para deglutirmos e de tudo o que, dada a nossa restrição orçamental, era importante sabermos para escolhermos em consciência. Após termos escolhido as canecas (o que, na relação preço/quantidade era mais favorável para nós), voltámos a estar ali uma eternidade para que o gajo nos trouxesse o que pedíramos (o que era mau, pois a bebedeira ia-nos passando e isso não era bom). Ficámos furiosos e jurámos vingança. Contrariamente ao que tantas vezes acontece – em que temos que esperar muito tempo para termos oportunidade para nos vingarmos ou nunca chegamos a ter ensejo disso – a oportunidade da vingança surgiu poucos minutos depois, quando tínhamos acabado de aviar a cerveja que viera nas canecas: o gajo desapareceu atrás do balcão e, em menos de um fósforo, apanhámo-nos a correr pela rua Padre António Vieira abaixo, sem termos dado a recompensa monetária devida pelo consumo realizado. Ao fundo da Padre António Vieira, estava (e ainda está) a Associação Académica de Coimbra (AAC), que já estava fechada àquela hora, mas decidimos entrar; claro está que o porteiro não nos deixou entrar, o que deixou o Marralheiro muito ofendido, pois quem era ele, o porteiro, um futrica!, para impedir dois estudantes da “velha guarda” de entrar na nossa associação? O Marralheiro começou a discutir com o homem, a dizer que tinha o direito de lá entrar, a mostrar os nossos cartões de estudante da universidade, a dizer que éramos estudantes, que ia fazer queixa dele, a pedir a identificação ao homem, a tomar notas de tudo, a dizer que eu tinha não sei quantas matriculas; quando o homem ouviu dizer que eu tinha não sei quantas matriculas (umas sete ou oito, na altura) o homem sai-se com esta: “já tinha tempo de ter acabado”; o Marralheiro, fingindo-se muito ofendido, retorquiu: “O quê? Está a insinuar que o meu colega é burro?” e, anotando no papel, escreveu ao ritmo em que dizia, alto e bom som: “Insinuou que o meu colega é burro…”.
Nesta altura, apareceu um gajo da nossa faculdade que trabalhava na Rádio Universidade de Coimbra (RUC) e que entrou por ali dentro, sem se identificar, pois o porteiro já o conhecia. O que o porteiro foi fazer! O Marralheiro foi aos arames, que o homem era um incompetente, que não nos deixava entrar, a nós, que éramos estudantes e estávamos identificados e que tinha deixado entrar um gajo sem se identificar, provavelmente um ladrão! Enfim, chagámos quanto pudemos a cabeça ao porteiro, mas nada o demoveu, por isso, e já que ele tinha deixado entrar um gajo, sem se identificar, na AAC – como disse, provavelmente um ladrão! – resolvemos ir chamar a polícia, para evitar que se consumasse o assalto à AAC! Fomos até à Praça da Republica, mas não encontrámos nenhum, pelo que fomos até junto dos taxistas, a ver se algum tinha visto algum polícia, mas ninguém vira nenhum; acabámos por desabafar “é que a Associação Académica está a ser assaltada”; os taxistas ficaram muito preocupados e disseram-nos que podíamos utilizar um telefone qualquer para chamar a polícia, que se era uma questão assim tão grave… Mas não, decidimos que era melhor continuar a procurar, pois, certamente, haveríamos de encontrar um ali por aquelas bandas.
Continuámos a procurar um polícia e acabámos por ir ter à porta de um bar ali mesmo ao pé da AAC, que, na altura, se chamava “Urbanidades” e hoje não sei que nome tem, pois já teve vários desde então. À porta do “Urbanidades”, mesmo à frente do segurança, começa o Marralheiro: “E se entrássemos aqui neste bar para partir uns copos?”; digo eu: “Não sei. Achas que sim?”; “Acho que era uma ideia fixe”, continuou ele. Nesta altura o porteiro interveio: “Vocês não põem cá os pés dentro”; o Marralheiro, fingindo-se muito surpreendido, olhou para ele e disse: “Ai! Não é que o gajo nos estava a ouvir?”; o gajo: “Gajo, não! Senhor gajo!”; soltando uma gargalhada, com aquela cara de gozo que o Marralheiro faz quando está com a bebedeira, retorquiu: “Tem razão! Senhor gajo! Desculpe lá, senhor gajo!” e voltou a rir-se na cara do homem; o homem, já começando a ficar irritado, disse: “Não metem cá os pés nem hoje, nem nunca!”; após outra gargalhada, com um sorriso bêbado ainda mais marralheiresco que antes, diz o nosso herói carregalense: “Eu, um dia, corto a barba, entro aí nessa espelunca, e parto tudo quanto é copo que aí estiver dentro!” e voltou a rir-se na cara do homem, que não soube o que responder, mas também não teve muito tempo, pois concluiu o Marralheiro: “Vamos embora, deixemos aí o senhor gajo trabalhar e voltamos cá outro dia partir uns copos”.
Como já era tarde, decidimos vir para cima, para os Olivais, para casa. Só que, na zona do liceu José Falcão, decidimos ir à GNR, pedir para soprar no balão, para ver quem estava mais bêbado. Dirigimo-nos à portaria e inventámos uma história que tínhamos estado a beber uns copos e que tínhamos o carro mais à frente e não sabíamos se estávamos em condições de levar o carro para casa, por isso, se fosse possível verificar… Os senhores agentes da autoridade, até acharam muito bem, que sim senhor, que assim é que deviam ser todos! E foi o Marralheiro o primeiro a soprar: 0,95. Não, o Marralheiro não podia conduzir; preparei-me eu para soprar, mas os senhores GNRs perguntaram se eu tinha bebido menos; é que, se tivesse bebido a mesma coisa, nem valia a pena experimentar; disse que não (mentira, tínhamos bebido exactamente a mesma coisa, mas eu também queria saber como estava) que tinha bebido menos; resultado: 1,95. “Você já ia preso!”, disse o GNR, “tem a certeza que bebeu menos?”. “Sim, só que, como o meu colega é mais gordo, aguenta mais do que eu”, respondi. Depois ainda perguntaram onde tínhamos o carro, para onde íamos e se queríamos boleia, mas dissemos que não valia a pena, que tínhamos o carro ao pé da igreja dos Olivais e íamos para o Tovim, mas que, se estávamos assim tão bêbados, até nos fazia bem andar um bocado para a bebedeira passar. A verdade é que morávamos ao pé do pavilhão dos Olivais e que nos sentíamos em perfeitas condições, quase como se já não estivéssemos com a bebedeira. Ao afastarmo-nos, ainda os ouvimos comentar entre si: “Que rapazes conscienciosos!”.

1 comentário:

Anónimo disse...

Por acaso também eu e meu amigo 2.9(este nome porque foi pro INEM com coma alcoolico com este valor), fomos a PSP fazer o teste do balão depois de beber uns valentes copos no Jocas Bar. Demos a mesma desculpa que iamos conduzir. O 2.9 foi o primeiro e aquilo pelo que me lembro deu 2.1, a seguir tambémm pedi para fazer o teste mas o homem disse logo que não adiantava porque tinhamos bebido juntos, ainda insisti com o homem mas não adiantou.