23 junho 2008

Rondas das Faculdades

Nos gloriosos tempos em que passámos por Coimbra, e mais ainda no auge da Tesoural Tertúlia Irmandade das Sombras, todos os pretextos eram bons para irmos para os copos e não irmos às aulas. Assim, tenho contado muitas histórias, quase todas elas com copos à mistura; falei-vos até de bebedeiras organizadas no Pinto ou de Festas do Litro y Meio, ou das rondas das tascas da Rua Direita; mas era necessário inovar, até porque nós éramos uma tertúlia que andava anos à frente do nosso tempo e esta história de inovação, de que tanto se fala agora, era para nós, que éramos uns visionários, uns autênticos Júlios Vernes do nosso tempo, aquilo que pretendíamos todos os dias! Assim, lembrámo-nos de fazer as famosas “Rondas das Faculdades”, que consistiam em ir a cada bar de cada faculdade ou departamento da Universidade de Coimbra, beber uma cerveja em cada um, e avaliar o bar; a avaliação obedecia a certos parâmetros, tais como as bebidas alcoólicas que se lá vendiam, as marcas das cervejas, os preços, o espaço, o ambiente, o atendimento e as mulheres! Claro está que cada item destes tinha uma certa ponderação na nota final do bar, sendo que as bebidas alcoólicas servidas e as mulheres eram os itens com maior peso, claro! Assim, cada um lá ia munido do seu papel e cada um dava a nota que muito bem lhe aprouvesse. No fim (no dia seguinte, pois nesse dia já não dava) os que ainda não tivessem perdido o papel na bebedeira, lá se juntavam e faziam as contas, saindo dali o bar vencedor. Em boa verdade, a classificação era o menos importante e a copofonia era o que verdadeiramente interessava!
As “Rondas das Faculdades” eram anunciadas com cartazes no bar da FEUC, de tamanho A3, e que já estavam previamente feitos a computador, bastando apenas preencher à mão os espaços deixados em branco, que eram o dia, a hora e a número da ronda. Se bem me lembro (mas posso estar enganado, pois já lá vão muitos anos) chegámos à XIV edição! Com o espalhar da fama das “rondas”, chegámos a ter um número bastante considerável de participantes, tudo em nome da avaliação da qualidade dos bares da nossa universidade!
Para dizer a verdade, nem me estou agora a recordar de nenhuma história extraordinária que tenhamos vivido, a não ser a vaga recordação de, perto do fim das “hostilidades”, haver sempre malta muito bêbada deitada pelas ruas, de muitos vómitos e até de alguns que tiveram que ser levados a casa.
No entanto, houve uma história de que ainda nos rimos bastante hoje, que teve a ver com as “rondas”; foi uma das primeiras, pois lembro-me que ainda não tínhamos o cartaz oficial e lembro-me que o Marralheiro era muito novo. Eu e o Branquinho lembrámo-nos de marcar uma “Ronda das Faculdades” e, como ainda não tínhamos o cartaz oficial, pegámos num papel qualquer (provavelmente papel timbrado da Irmandade das Sombras) e começámos para lá a escrever um qualquer paleio pomposo acerca de fazermos um estudo científico à qualidade dos bares da nossa magnífica universidade; após o paleio pomposo, e como ainda tínhamos espaço na folha, resolvemos inventar citações de grandes economistas, tais como Adam Smith, David Ricardo e Keynes; a primeira citação dizia “Que Deus nos ajude a levarmos a bom porto tão importante tarefa”; a segunda era qualquer coisa do género e a terceira era “T’ arrenego Barzabu!”; como ainda sobrava espaço, resolvemos escrever uma citação, também falsa, do Marralheiro e que era: “Ai Jesus, cruzes canhoto, lagarto, lagarto lagarto!”. Como era óbvio, nenhum destes senhores, nem o Keynes, nem o Ricardo, nem o Adam Smith tinham dito, que se saiba, estas frases, mas ficava engraçado e seria uma honra para o Marralheiro, um aluno talvez do segundo ano, estar ali misturado com grandes históricos da teoria económica!
Mas qual quê! Quando o Marralheiro viu aquilo ficou danado, enervou-se por estarem ali a meter o seu nome como tendo citado “Ai Jesus, cruzes canhoto, lagarto, lagarto lagarto!”. A nossa surpresa foi enorme, pois, conforme lhe dissemos, o nome dele estava entre os grandes economistas da história, mas nada, pois, segundo ele, aquilo não interessava nada, o que interessava era que ele não tinha dito aquilo! E se não tinha dito aquilo, se não tinha dito “Ai Jesus, cruzes canhoto, lagarto, lagarto lagarto!”, ninguém tinha o direito de meter lá essa citação como sendo dele! Ah, camarada Marralheiro, também tivemos a nossa cruz a carregar contigo!

1 comentário:

Xana disse...

Infelizmente só tive oportunidade de participar numa ronda, mas diverti-me tanto que valeu por todas! Grandes tempos...