29 novembro 2010

Rasganço do Bosch.


Há pouco tempo um amigo do Coral acabou o curso. Era um indivíduo alemão que veio para Portugal tirar a sua licenciatura por causa de uma portuguesa que conhecera na Alemanha. Chegou cá mal falava português, mas integrou-se maravilhosamente na Tuna da FEUC. Quando fez o seu rasganço enviou o mail que se segue a convidar os amigos a estarem presentes neste dia tão inesquecível. Achei o mail tão espectacular, tão significativo do que é o amor a Coimbra e à vida de estudante de Coimbra, tão romântico como creio que todos nós da TTIS éramos/somos, bem como a resposta do Brandão (um dos contribuidores deste blogue) que lhes pedi autorização para as publicar. Como nota, acrescentar que os versos que surgem no início do convite são de uma balada de despedida da FEUC, da autoria de dois coraleiros (Sardão e Lhama), a qual faz parte do CD do Coral Quecofónico do Cifrão - Tuna da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e que estará à venda em breve (aceitam-se encomendas :D ).

Cara amiga...caro amigo...

O Mondego anuncia
surge um barco sem maré
aguas ternas duma vida
que passou...

os momentos que eu vivia
do penedo até a sé
a certeza de uma ida
desta hora que chegou...

e levo-te Coimbra no meu peito
vontade de um dia regressar
saudades deste mundo perfeito
memórias que me fazem recordar...

envolvo a minha capa ao luar
batina tão ferida no adeus
vivências que eu quero abraçar
segredos dos belos olhos teus...
...
o Mondego anuncia
a tristeza do momento
a calçada triste e fria me levou...

os momentos que eu vivia
que voaram
com o vento...

ao nascer de um novo dia
nova vida
que me dou...

e levo-te Coimbra no meu peito
vontade de um dia regressar
saudades deste mundo perfeito
memórias que me fazem recordar...

envolvo a minha capa ao luar
batina tão ferida no adeus
vivências que eu quero abraçar
segredos dos belos olhos teus...
----
Parece que foi ontem que cheguei à FEUC, sendo caloiro em 2006, caloiro em Coimbra, sem saber no que me ia meter, sem saber falar português (além de perguntar onde ficava a padaria mais próxima e dizer que tinha meias pretas). Sendo resultado de uma história de amor excepcional (*amo-te dora*) Caloiro em Coimbra, num universo diferente, fiz as malas depois de acabar a escola na Alemanha e vim para Portugal. Porque não? "Sa fo**", é aventura.
Passei um ano lectivo de caloiro, sendo praxado sem perceber o que os doutores queriam de mim, a única praxe que percebi foi "de quatro", então passei esse ano próximo do chão... Faz parte da experiência...
Através do meu grande padrinho Siririca, que fazia e faz parte da tuna da FEUC, do grande Coral Quecofónico do Cifrão, entrei num mundo diferente, de tradições únicas, vivências especiais, que só uma parte dos estudantes de Coimbra durante a sua vida académica vão mesmo conhecer.
Através desse grupo excepcional de amigos que é o Coral, conheci a vida académica da cidade universitária de Coimbra até aos mais profundos contextos, e vivi essa vida ao máximo. Integração? Não tinha escolha. Agradeço a todas as pessoas envolvidas.
E não só Coimbra. Percorri o país todo, em viagens para festivais de tunas (!PQP! a Covilhã. nunca mais lá vou. Sem a capa provavelmente teria morrido nas valetas da serra...) e vinho (Viva Aveiras!!! Vivam os cavaquinhos!!!). Conheci não só um país e uma cultura espectacular e diferente, mas um mundo lindo e rico, a que sempre pertencerá parte do meu coração.
Recentemente acabei a licenciatura e acabei de perceber que se está a encerrar um capítulo único na minha vida. Felizes os que se podem chamar estudantes.
Meses antes de acabar os estudos, comecei a procurar trabalho em Portugal, para continuar pelo menos uma parte dessa vida, mas parece que o destino tinha outros planos para mim, pelo menos por enquanto. No fim de muitos "Muito obrigado pelo seu interesse...", recebi uma proposta de trabalho de uma empresa suíça, em Zurique. Sem alternativa, mas também (para ser honesto) atraído pela qualidade excepcional de vida na Suíça, aceitei, fiz as malas mais uma vez, e vim à Suíça, onde se fala estrangeiro... Cá estou, a viver uma vida nova.
É nesse contexto que quero-te convidar para o meu rasganço.
(…)
Saudações académicas
Florian/Samba.

Resposta do Brandão:
Caro Samba,

Não te conheço. Isto é, não andámos juntos na escola e nunca privámos embora creia que nos cruzámos num jantar ou outro evento do Coral. Como dizes que entraste talvez tenha sido em 2007 a última vez que estive em Coimbra.
Mas a tua presença constante na Mailing List (ML) tem feito de ti um conhecido virtual. Sempre achei estranho como é que um alemão andava por aqui tanto tempo. Normalmente o Erasmus é um ano ou menos... mas tu foste ficando, ano após ano. Naturalmente que, apesar de isso me causar algumas interrogações, não sendo essa questão de muita importância não passava disso mesmo - de uma interrogação curiosa - e por isso cá me fui habituando a ti, aos mails que chegavam com o fuso horário CET (algo a que alguns dos nossos ilustres colegas da ML iriam chamar vírus) e que por isso apareciam depois de algumas das respostas a esses mesmos mails e ao teu português macarronicamente imperceptível e que evoluiu até a um nível que, não sendo perfeito, creio que podemos dizer que é notável; agora, mais recentemente, recordo também o falecimento do teu pai - o acontecimento mais triste que recordo nesta ML - e a conclusão do curso.
Hoje chegou a explicação para a tua presença continuada "entre nós". Já sabia que não eras um Erasmus, mas agora sei porque estiveste cá. Dora... a Dora explica tudo... um homem que faz 2000 kms para vir atrás de uma Dora, tinha de ter como destino fundir-se com a tuna mais romântica de Coimbra, diria de Portugal: o Coral.
O teu e-mail emocionou-me. Por uma lado pela forma simples como descreves a tua integração que faz cair por terra o estereótipo do nórdico frio e calculista, do alemão que rege toda a actuação pelas minuciosas descrições dos manuais e que é substituído pela imagem de um mediterrâneo capaz de sentir, de desenrascar, de perder a cabeça. Um homem como nós e que por isso mesmo se tornou num de nós, mesmo para os que de nós não te conhecem de verdade.
Por outro lado pelo facto da resposta à tal interrogação latente ter chegado desta forma tão inesperada e ser tão... fantástica. "A Dora está em Zurique?", atrevo-me a perguntar, sem realmente querer que me respondas. Espero que sim porque o lugar dela deve ser ao teu lado. E se não estiver, parece-me que será ela que está no prejuízo, penso, ainda estonteado pela força dos tais 2000 kms.
E sob o efeito dessa emoção o teu mail desencadeou em mim uma série de pensamentos: fez-me pensar na força que tem este Coral, que ajudei a criar há 16 anos; pensar como é ele (Coral) que me permite manter um pequeno contacto com esse mundo que já foi meu; pensar como é ele que me faz conhecer, mesmo sem conhecer, tanta e tanta gente e me dá o privilégio de estar aqui a escrever-vos confortavelmente esparramado no sofá da minha casa enquanto os meus dois anjinhos e a minha "Dora" [que me acompanha desde há 17 anos, altura em que nos conhecemos em Coimbra] dormem tranquilamente; pensar como é ele que me dá o privilégio de poder juntar, simultaneamente, os meus velhos amigos com uma série de outra gente que entrou entretanto para o Coral e que já conheci e com quem criei laços - malta até 2006/2007, pois a partir daí o nascimento dos meus filhos dificultou a minha presença em Coimbra - aos que mal conheço e até aos montes de esterco que são os caloiros que chegam agora - 20 anos exactos depois de mim - para pisar esses corredores, aturar esses professores e palmilhar as ruas e tascas de Coimbra.
E por isso, sendo quase certo que me será impossível estar para a semana em Coimbra, queria que esta resposta fosse um agradecimento por esses bons pensamentos que esse mail me proporcionou e servisse simultaneamente de abraço de parabéns e sorte para ti, que seja extensível a todos os que foram capazes de ler isto até aqui (e que já não devem ser muitos).

Brandalius

9 comentários:

Georgius Brandalius disse...

Sugiro que coloques os nomes dos autores da Balada. Se não for possível no original, então em comentário.

Um abraço. Obrigado por publicares isto.

Batinas disse...

Já agora, convém aqui referir que os autores da balada a que pertencem os versos são o Sardão (Sérgio Sousa Andrade) e o Lhama (Luis Almeida). Quanto a ti, Brandão, não tens nada que me agradecer, pois não te fiz nenhum favor; eu é que tenho que te agradecer por me teres autorizado a publicar aqui a tua resposta ao convite.

Jardel disse...

Já agora... Parabéns Lhama!!!!

Xana disse...

Fogo! Eu ca posso agradecer por terem partilhado. Brandao, a tua resposta levou-me as lagrimas. Obrigada!

DORA disse...

Pois, e eu agradeço a todos, pois ambos os emails me levaram às lágrimas...:) Folgo em saber que este Sentimento é partilhado e vivido, não só pelos actores principais, como por quem nos rodeia - e que ninguém fica indiferente a tal história [de Amor], tão pura e tão forte, que tem Coimbra como palco.
E é mesmo isso que nos une, Coimbra...Onde, algo de extraordinário que aconteça aos seus Filhos, é vivido e festejado em toda a Família... sendo esta a melhor de todas: a Família Coraleira =)
Bem-hajam! *

A DORA,
do Florian/Samba

Georgius Brandalius disse...

Batinas,

uma vez que me questionas publicamente o porquê de eu te agradecer a publicação do mail, vou-te responder também publicamente, referindo que nada te disse sobre isto até ao momento (creio que já estivemos juntos depois desta publicação) de propósito para guardar para aqui vir escrever.

Creio que sabes que há quem defenda que a realização de um homem passa por escrever um livro, plantar uma árvore e ter um filho. Ora eu que já plantei milhares de árvores e já tenho dois filhos ainda não escrevi o meu livro e é uma coisa que muito gostaria de fazer.

Até lá, tens de convir que ter um amigo que lê um mail enviado para uma lista de que somos ambos membros - ou outro qualquer escrito - e que o acha digno de ser publicado para o público em geral, sem que ele próprio esteja envolvido directamente no conteúdo do mesmo, e portanto não tendo aqui o seu próprio interesse pessoal em jogo e no nosso blogue onde temos vertido as memórias dos nossos dias de folguedo em Coimbra, é algo que me deu grande contentamento, para não dizer mesmo orgulho.

Um gajo quando escreve, escreve para ser lido e o teu acto - a publicação - permitiu evidentemente que mais pessoas lessem. Embora na data em que te agradeci não o soubesse (mas quiçá já o previa) foi graças a essa publicação que pude conhecer as confessadas lágrimas da Xana (quem és tu Xana? És a Xaninha ou a Dulce de 1993/1994 - mais ano, menos ano) outra "outsider", as quais me trouxeram a mim como podes imaginar mais um pouco de alegria e emoção (sem qualquer prazer sádico). Quanto às da Dora como também sabes ela já tinha escrito para a lista e por isso não foram surpresa, mas ainda assim mais um bocadinho de alegria para o teu velho padrinho.

E já agora que estou para aqui com estas lamechices, aproveito para fazer também um agradecimento público ao Llama que lançou e ao resto da malta que assinou um mail que circulou a seguir ao meu na lista de difusão, que também encarei como um tributo ao que tinha escrito.

Por isso aqui te reitero o meu obrigado esperando que tenha ficado claro que se alguém aqui ficou claramente beneficiado com esta publicação fui eu próprio.

Abraços aos machos e beijinhos às meninas que continuam por aqui a dar-nos o orgulho de nos lerem e seguirem (que não são tão poucos como isso, a aferir peo contador do blogue).

Tiago disse...

É possivel indicarem-me o endereço da mailing list, ou é algo privado entre os membros do blog?
Desde ja agradecido pelas historias que partilham ;)

Carolus Alvus disse...

A Lista de Difusão que é referida aqui encontra-se reservada aos membros (actuais e antigos) da Tuna da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra

Georgius Brandalius disse...

Acrescentaria que nessa mailing list se tratam essencialmente assuntos de foro privado da Tuna, que, salvo casos excepcionais, não têm interesse para o público em geral.

Pela nossa parte agradecemos o interesse.

Cumprimentos