30 julho 2009

Exames e Orais.

Durante os tempos em que os vossos heróis (nós) estudaram na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, muitas coisa engraçadas se passaram por lá no que toca a exames e a orais. Hoje vou-vos contar algumas das histórias que por lá se passaram.
O Júlio Mota e a Economia Internacional eram um dos ossos mais duros de roer naquela faculdade, mas o Vítor Matos, já não me lembro se foi alguma oral ou se foi a defesa de algum trabalho, lá teve que o enfrentar; uma das histórias de que me lembro, foi de o professor, numa daquelas suas tentativas de deitar abaixo os alunos, perguntar ao Vítor que livro andava ele a ler, na esperança de que a resposta fosse “nenhum” ou um qualquer “best seller” diabolizado pela classe dita intelectual, para poder chamar ignorante e iletrado ao Vítor, mas este respondeu-lhe (não sei se mentira, ou verdade) “A Bíblia”; não aguardando de maneira nenhuma esta resposta, o Dr. Júlio Mota (que conheci um pouco melhor, em casa de um amigo comum, após ter acabado o meu curso, e que me pareceu muito melhor pessoa do que quando eu era um simples estudante) calou-se e não tocou mais no assunto, surpreendido pela resposta.
Certa vez o Caçador (um amigo nosso, que nunca teve estaleca para entrar para a Irmandade das Sombras) foi a um exame de Introdução ao Direito e chumbou, com um “R” na pauta. Andou atrás do professor para ver o exame, para saber por que motivo tinha chumbado e nunca conseguiu esse desiderato. Mas parece que a sua insistência foi tão cerrada que um dia, em plena época de Setembro, o professor entra numa sala de exames e pergunta se “Raul Caçador lá estava”; como o nosso amigo lá estivesse levantou o braço, ao que o professor, irritado, lhe disparou esta à frente de toda a gente: “Você anda aqui há não sei quanto tempo atrás de mim para ver o exame e saber porque chumbou, quando você nem 1 aqui teve!”.
O Branquinho foi fazer o exame de História Económica Portuguesa e andou lá com tolices acerca de os antepassados de David Ricardo serem portugueses e terem fugido para a Inglaterra por causa da Inquisição; parece que escreveu lá entre parêntesis “maldita inquisição” e o Romero Magalhães, que não era para brincadeiras, chumbou-o. Ora o amigo Branquinho resolveu ir ver o exame, para ver onde tinha errado. Chegou lá e lá estava o Romero, muito atencioso, a perguntar-lhe o nome. O Branquinho lá lhe disse o nome e o Romero buscou nos exames à procura do exame dele. Quando o encontrou, fez uma cara de espanto e disse, atónito: “Então, mas o senhor chumbou!”; “Pois chumbei”, disse o Branquinho; “Então, o que faz aqui?”, retorquiu Romero; “Quero ver porque chumbei”; “Chumbou porque não respondeu bem às perguntas!”, concluiu Romero, não deixando o Branquinho, para seu grande espanto, ver o exame.
Outra vez o amigo Branquinho foi a uma oral de Economia Regional com o professor Barbosa de Melo. Quando lá chegou, estava um desenho no quadro, que correspondia a um modelo de Weber que estudávamos para aquela cadeira e que era impossível não saber. Certamente tinha sido desenhado por algum aluno a quem tinham solicitado que representasse o modelo de localização industrial de Weber e que se esqueceram de lhe pedir para apagar. Ora, quando o Branquinho lá entrou, o professor disse-lhe: “Está a ver essa garatuja aí no quadro?”; “Estou”, respondeu o Branquinho; “Sabe-me dizer o que é isso?”; “Sei. É um triângulo inscrito numa circunferência!”, respondeu, sabendo muito bem o que era aquilo, mas só para chatear; “Certíssimo!”, respondeu o professor achando piada, “Mas se tivesse que associar isso a algum modelo que estudou nesta cadeira, a quem associava isso?”; “Ao modelo de localização industrial de Weber”; “Muito bem. Então diga lá o que é actual e o que não é actual nesse modelo”. O Branquinho começou a desbobinar aquilo tudo e, a certa altura, o professor interrompe-o para lhe dizer que aquilo que o Branquinho estava a dizer era o B-A-BA da economia, ao que o Branquinho lhe respondeu: “O que o Sr. Professor me está a perguntar é o B-A-BA da economia…”; “Calma! Calma!”, continuou o professor, “Não se enerve!”. E, após isto, fez-lhe mais uma ou duas perguntitas de caracácá e passou-o.
O Marralheiro foi a uma oral de Estatística II e não sabia nada daquilo. Segundo dizia, não sabia como tinha ido à oral, mas lá foi. Antes de entrar, naquela normal azáfama antes de entrar para a sala, o Marralheiro perguntou lá uma coisa a um fulano que também lá estava para fazer oral, ao que o indivíduo lhe respondeu, mostrando-lhe uma fórmula que se aplicava àquele caso. Entretanto chegou a vez do nosso herói e, não é que lhe fazem logo aquela pergunta?! O nosso amigo escarrapachou a fórmula no quadro e, tendo ouvido sons de incitamento, mas não sabendo o que fazer com aquela fórmula, começou a desenvolvê-la matematicamente; foi resolvendo até que chegou a um ponto em que não dava para avançar mais e parou. Nesta altura o professor disse: “Muito bem. Agora diga lá que lei é que isso segue…”. O Marralheiro não sabia, por isso pegou lá nas tabelas estatísticas que se usavam (e devem continuar a usar, digo eu) e abriu-as. Eu interrompo aqui para dizer que o que custava nessa matéria de Estatística II era, precisamente, saber que lei aquelas porcarias seguiam, pois o resto era decorar umas fórmulas; ora, quem não soubesse depois aplicar a lei correcta, era o mesmo que nada (ou quase). Dizia eu que o Marralheiro abriu as tabelas estatísticas na primeira página (e primeira lei) e disse, hesitante: “É esta…”; “Não”, respondeu o professor; virou a página e apontou para a segunda lei: “É esta…”; “Não”; voltou outra página e hesitou de novo: “É esta?…”; resposta negativa de novo. E foi assim, sucessivamente de lei em lei, até chegar à última página e responder, mais confiante: “É esta!”. “Muito bem”, foi a resposta do professor. No fim, o professor disse-lhe que ele até percebia alguma coisa da matéria (!!!), que só não sabia muito bem que leis é que as coisas seguiam, mas lá o passou!
Quando fui fazer Contabilidade Geral andei a tentar estudar aquela porcaria com um colega que não vejo há muito tempo – com muita pena minha, pois era um gajo muito “fixe” – o Sérgio Nuno; ora, aquela porcaria não me entrava na cabeça, até porque como eu detestava aquilo já desde os tempos de liceu, não estudava nada e pouco mais fazia que distrair o meu amigo (daí aquilo não me entrar na cabeça!). Sucedeu então que, pouco antes do exame achei por bem não pôr lá os pés, mas o Sérgio disse para eu ir, pois não perdia nada e sempre podia ser que desse para eu copiar por ele, que ia tentar subir o 10 que tivera na época transacta. Assim fiz e, no dia do exame, lá estava eu, sentado num anfiteatro, atrás do Sérgio. Aquilo correu que foi uma maravilha: não só o professor das aulas teóricas não apareceu com os seus 5 valores da teórica, tendo o Conselho Pedagógico decidido nos atribuír os 5 valores directamente, como o professor que estava a vigiar abriu o enorme jornal e não prestou atenção nenhuma a quem copiava ou deixava de copiar; foi um fartote! Copiei quanto quis pelo Sérgio e a nota foi… 8, tal como o Sérgio que ia subir um 10, que sabia daquilo e que também tivera os mesmos 5 valores da teórica! Ora, como podia eu ir à oral, se eu não “pescava” absolutamente nada daquilo? Mas lá me convenceram e eu fui. Éramos 20 naquela manhã para a oral e o professor das teóricas não apareceu. Que orais aquelas! O professor das práticas à porta a falar com o pessoal que estava para a oral e um gajo lá dentro a escrever no quadro. E as perguntas eram básicas e uma só a cada aluno! Foi passar, passar, passar, até que o professor das teóricas chegou! Foi o desespero de quem não tinha feito ainda oral. Entraram os dois na sala, sentaram-se e começaram a fazer orais mais complicadas, mas o pessoal continuou a passar todo. Não acreditando muito na passagem, perguntei a um indivíduo que lá estava como se registava uma compra e uma venda (o mais básico, mas nem isso eu sabia!) ao que o gajo me pergunta: “Em inventário periódico ou permanente?”. “Sei lá!”, respondi eu, que nem sabia que havia maneiras diferentes de registar compras ou vendas, “a mais fácil!”. O gajo lá me ensinou e as orais foram correndo até que chegou a minha vez, que me deixara ficar para último. Já seriam cerca de 14h30. Entrei com os enormes calhamaços da cadeira (que não lera) e pousei-os na secretária. Então passou-se o seguinte diálogo:
Professor – Que grandes livros aí traz…
Batinas – É para aproveitar para estudar até à última!
P – Então você não tem vergonha de terem-lhe dado 5 valores e, mesmo assim, só ter conseguido tirar 8?
B – Sim, mas a correcção do exame também foi extremamente rigorosa…
P – Bem. Deixemos lá isso. Está nervoso?
B – Um bocado.
P – Olhe lá, você não gosta lá muito de Contabilidade Geral, pois não? (informo aqui que o professor não me conhecia de lado nenhum, pois eu nunca tinha ido às aulas, nem era um estudante conhecido, naquela altura).
B – Sinceramente, não!
P – Ah! Ah! Ah! Só por isso merece passar! Vá-se lá embora!
Incrédulo, sem saber se estava a ser gozado ou não, vejo o professor das práticas escrever um 11 na oral e um 10 de nota final! Nem pensei duas vezes: agarrei nos livros e saí porta fora. E agora reconheço que foi justo, pois as minhas respostas, tirando a de os livros estarem ali comigo para estudar até à última (que foi falso, eram só para fazer de conta), foram todas correctas, por isso acho que o 11 da oral até foi pouco!
Houve também uma oral minha muito engraçada a Organização Económica Internacional com o Joaquim Feio, mas essa já foi contada neste blogue e podem lê-la na crónica com o nome “Joaquim Feio”.
Outra oral engraçada passou-se também com o Branquinho; foi a Estatística II. Havia lá uma fórmula qualquer que pediram ao Branquinho para a desenvolver. O Branquinho lá a desenvolveu e chegou a um ponto em que ia escrever (ou melhor, escreveu) uma asneira e o professor interrompeu-o com um “Alto! Acha que isso está bem?”. O Branquinho interrompeu e olhou para aquilo, reparando no erro (tinha escrito numa das parcelas a derivada da variável em ordem à função, em vez da derivada da função em ordem à variável – para quem entender, tinha escrito dx/df em vez de df/dx), disse: “Calma, ainda não acabei!” e zás, com uma presença de espírito notável, eleva a -1, que já estava correcto, embora não se costumasse fazer aquilo. A verdade é que se escrevia df/dx, mas escrever dx/df e elevar a -1 é exactamente a mesma coisa! No fim, ainda teve a lata de perguntar ao professor se estava bem, o qual teve que admitir que sim.
Outra oral engraçada do Branquinho foi a Introdução à Economia, com o Júlio Gomes. O Branquinho, como tinha muita facilidade com a matemática, dava estas reviravoltas ou mandava estas bocas sempre que podia. Então nessa oral, o Branquinho entrou e estava desenhado no quadro um gráfico de oferta e de procura (tenho muita pena, mas não sei desenhar isso num computador, por isso vão ter que ficar pela minha descrição, o que é mau, para quem não conheça estas matérias), pelo que o Júlio Gomes perguntou-lhe se ele estava a ver aquilo, ao que o Branquinho respondeu que sim e pensou que já tinha respondido bem a uma pergunta; então o Júlio Gomes perguntou-lhe o que é que aquilo representava e o Branquinho, com a sua lata, em vez de dizer que era um gráfico de oferta e procura (que sabia perfeitamente), resolveu desconversar e respondeu: "Representa o 1.º quadrante dos eixos cartesianos; ao eixo das abcissas chamaram Q, ao das ordenadas chamaram P; existe uma recta de inclinação positiva a que chamaram S e uma de inclinação negativa a que chamaram D". Desconcertado com a resposta, o Júlio Gomes respondeu “Muito bem” e o Branquinho pensou “já acertei em duas respostas!”. Mas o Júlio Gomes continuou, pois ainda não estava completamente convencido da sapiência do Branquinho: "Olhe, e se eu lhe dissesse que isso é um gráfico de oferta e de procura, qual é a recta da procura?"; "É a D" respondeu o Branquinho; "E a da oferta?"; "É a S". Com isto terminou a oral, da qual o Branquinho saiu passado!
Também tive uma oral de Matemática I e, para ter mais tempo para pensar enquanto escrevia, banhei o meu polegar direito em mercurocromo e enrolei um penso rápido, para dar ideia que estava magoado e poder escrever mais lentamente; a juntar a tudo isso, ainda levei uma t-shirt vestida que tinha escrito nas costas: "Se estudar é a luz da vida, não estudes poupa energia". Num daqueles momentos em que escrevia muito lentamente a pensar bem o que estava a fazer, ainda ouvi a professora Teresa Pedroso de Lima a dizer, com simpatia: "Ande lá, mais depressa, não poupe tanta energia!", ao que lhe respondi, que não podia, que tinha um grande golpe no dedo! O resultado final foi o pretendido: 10 valores!
Finalmente, recordar uma triste oral do Patrício, a Introdução ao Direito, a sua primeira oral e que traumatizou um bocado o rapaz. É que ele nem estava a contar ir a oral e foi o último; ainda por cima, todos os outros tinham passado. Ao que consta, o professor passou a oral toda a enrolar papeis e a lançá-los ao lixo, tipo basquetebolista e, no fim, o pobre Patrício não só chumbou, como ainda teve que ouvir do professor: “A sua oral ainda foi pior que a escrita!”. Mas a vida é assim, acabou por passar noutras e eu também fiz algumas cadeiras em oral e também chumbei (imerecidamente, claro!) noutras. O que interessa é que a coisa se fez.

1 comentário:

Stradi disse...

Quim, vou fazer um comentário um bocado gay, nem a tua mulher te deve dizer coisas destas, mas é uma delícia ler estas crónicas!
Abraço,
Stradi