Em artigos anteriores já foi dito de diversas formas que as noites de serenatas eram uma das actividades mais acarinhadas pelos elementos da TTIS. (veja-se sobre este assunto os artigos "Do canto desafinado às noites de serenatas"; ou "Histórias de serenatas"; ou ainda "Mais histórias de serenatas")
Ora, pouco a pouco, fomo-nos apercebendo que isto de ensaiar uns minutos antes da serenata não dava grandes resultados. Para além disto, havia pessoal assíduo às serenatas cujo contributo era essencial, mas que não se enquadrava nos parâmetros praxísticos exigidos para fazer parte da TTIS.
Esta questão acabou por ser resolvida, nos idos de 1993, quando foi instituído nos Estatutos da TTIS a existência o Coral do Cifrão como "veículo de expressão artística e cultual" da Tertúlia. Desta forma, admitiam-se elementos externos apenas para as actividades coraleiras e abria-se a porta para dar uma maior seriedade e qualidade às prestações do grupo de serenatas "ad hoc" que até então existia.
Claro que, daí até à primeira actuação um largo e sinuoso caminho foi percorrido, mas não é desse que vos quero dar conta (até porque a minha memória já não mo permite).
Bom, o que é certo é que lá para Novembro desse ano demos início aos ensaios oficiais nos Imperiais Paços do Reino do Convénus Mustinto, a nossa Sede.
Longe estávamos nós de sonhar que aquele grupo de serenatas pouco a pouco daria lugar à Tuna que hoje é, mas as coisas são como são e saber que, de alguma forma, fomos responsáveis pelo fantástico grupo que hoje com toda a propriedade tem autorização oficial para se apresentar como a Tuna da FEUC só nos pode encher de orgulho!
Como podemos ver o nascimento da tuna está intimamente ligado às serenatas que fazíamos e esta é, para mim, a principal razão de os seus elementos ainda hoje actuarem de capa traçada. É esta também a razão de ser das duas canções originais mais antigas compostas especificamente para o grupo, refiro-me às "Lágrimas de Amores" e à "Serenata".
Não me vindo à memória qualquer pormenor mais ou menos interessante da composição da "Serenata", já o mesmo não se poderá dizer das Lágrimas de Amores, história essa que passo a narrar.
Bom, a opção por canções originais esteve sempre presente, uma vez que o Brandalius já tinha composto algumas que já haviam por nós sido adoptadas. São exemplos destas, "Se eu tivesse a tua mão" (que nos acompanhou nos primeiros anos e que infelizmente caiu no esquecimento das sucessivas gerações de coraleiros) e o "Porto do meu abraço" (que na minha modesta opinião é uma das melhores composições feitas por um coraleiro e à qual nunca foi dada o devido relevo).
Mas faltava-nos um original a que pudéssemos chamar de NOSSO! E esse tardava em aparecer...
Certo dia, no meio de uma tarde de estudo em época de exames, estava eu a ouvir uma gravação de uma tuna de Santiago de Compostela tomei conhecimento do ex-libris das tunas dessa academia, falo da canção "Tuna Compostelana", e disse para mim: "ora aqui está um tema passível de explorar!" e, logo assim de chofre saiu o refrão das nossas "Lágrimas de Amores": "Tricana se algum dia o Coral/Ao passar à tua porta cantar suas lindas canções/Não te apaixones por nenhum dos seus cantores/Que nas capas os rasgões/São lágrimas de amores!"
A melodia também saiu na hora e imediatamente e como a guitarra estava sempre ao pé de mim nessas alturas, a primeira harmonização também estava feita! O problema veio depois. É que nada mais consegui...
Pior ainda, o raio da música não me saia da cabeça! Com o passar do tempo comecei a ver que a tarde de estudo já estava a ir "para o caneco", portanto, desse lá por onde desse, aquela canção tinha que ser acabada!
Nessa altura surgiu-me uma ideia luminosa: "E se eu apresentasse isto ao Brandalius? Pode ser que ele quebre o enguiço!"
E, se bem o pensei, melhor o fiz, lá fui eu direitinho a casa da Tia Cidalina falar com quem sabia mais disto do que eu.
Entrado pelo quarto do Brandalius dentro, interrompo-lhe o respectivo estudo: "Tens que ouvir isto que acabei de fazer e dizer o que achas!" e agarrei na guitarra dele e trauteei-lhe o refrão.
"Está bom, mas o resto?"
"Bom, o resto estava eu à espera que o fizesses..."
Com um ar incrédulo, o Brandalius pega na guitarra e no manuscrito e começa ele a tocar a canção, findo o refrão pára apenas uns segundos com um olhar vago e canta de de uma golfada: "Ouve tricana com atenção a nossa voz/Treme com a luz se a serenata te agradar/Manda beijos e presentes para nós" (...)
"Hum, presentes não encaixa lá muito bem..."
"Flores..." Adiantei eu com um bocadinho de receio de lhe estar a interromper o momento criativo.
"Flo-res! É isso!" e continuou "Manda beijos e flores para nós/Mas não te esqueças do conselho que temos para te dar!..."
E toca a apontar, antes que se nos varresse da memória. De seguida, voltámos a tocar a canção desde o início para ver se estava tudo bem.
"Pá, só falta mais uma quadra e temos isto feito!"
"Só se falarmos do final da serenata." Adiantei eu.
"É isso!" Mais um compasso de espera e recomeçou, agora com maior fluidez pois a melodia já estava feita:
"Durante o sono que a seguir terás/Embala os sonhos com a nossa melodia/Mas de manhã, ao acordar, tu saberás/Que esse é o Sol de um novo dia"
Ainda hoje não consigo explicar como é que naquela tarde, quase sem rasuras se compôs uma canção que hoje, volvidos vinte anos, ainda é obrigatória nas actuações do Coral. Mas, o que é certo é que ela lá está, de boa saúde, e a motivar, sempre que se toca o primeiro verso do refrão, a resposta das nossas coraletes: "O CORAL!"
Sem comentários:
Enviar um comentário